segunda-feira, 20 de junho de 2011

Ausência, por Caio F Abreu.



Foi numa dessas manhãs sem sol que percebi o quanto já estava dentro do que não suspeitava. A tal ponto que tive a certeza súbita que não conseguiria mais sair. Não sabia até que ponto isso seria bom ou mau mas, de qualquer forma, não conseguia definir o que senti quando comecei a perceber as lembranças espatifadas pelo quarto. Não que houvesse fotografias ou qualquer coisa de muito concreto — certamente havia o concreto em algumas roupas, uma escova de dentes, alguns discos, um livro.. Mas as miudezas se amontoavam pelos cantos. E o que marcava e pesava mais era o intangível, o que não se podia medir ou descrever.  Eu sentia profunda falta de alguma coisa que não sabia o que era. Sabia só que doía, doía. Sem remédio. Pior que tudo, rondava um sentimento de desorientação. A minha mão direita conduzia espaçadamente um cigarro até minha boca. Minha boca sugava uma fumaça áspera para dentro dos pulmões escurecidos. Meus pulmões escurecidos lançavam pela boca e pelas narinas um fio de fumaça em direção ao teto claro, onde meus olhos permaneciam fixos. E minha mão esquerda tocava uma ausência sobre a cama ao meu lado. Não conseguia compreender como conseguira penetrar naquilo sem ter consciência e sem o menor policiamento: logo eu, que confiava nos meus processos, e que dizia sempre saber de tudo sobre mim mesma. Durante algum tempo fiz coisas antigas como chorar e sentir saudade da maneira mais humana possível: fiz coisas antigas e humanas como se elas me solucionassem. Não solucionaram. A verdade é que nada ia sanar aquele sentimento.. se sentir sozinho mesmo tendo alguém, tem base? Mas era assim que me sentia, e doía. Mas o tempo é meu amigo, ele vai passar e vai levar consigo essa dor. Enquanto isso vou vivendo assim, desse jeito meio torto que tenho vivido. Meio pelos cantos, vou juntando os cacos e alimentando o peito com o que me resta de concreto em mãos. 

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